Na abertura da turnê nacional que celebra seus 37 anos, o Balé Folclórico da Bahia (BFB) chega nesta sexta-feira (22) ao Rio de Janeiro, onde apresenta, no Teatro João Caetano, o espetáculo O Balé Que Você Não Vê. Fundado em 8 de agosto de 1988, o BFB vai passar pelas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste do Brasil. As regiões Norte e Nordeste também estão nos planos, mas sem datas previstas.
A capital carioca terá duas apresentações, nesta sexta-feira (22) e sábado (23). Em seguida, a agenda tem Campinas (25 e 26/09), São Paulo (28/09), Franca (1º/10), Florianópolis (17/10), Goiânia (22/10), Porto Alegre (28/10) e Novo Hamburgo (30/10). Esta é a primeira vez que a companhia faz uma temporada por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, a Lei Rouanet, e do Ministério da Cultura.
Notícias relacionadas:Exposição de Ricardo Stuckert retrata força de povos indígenas .Livro mostra que hip hop conquistou mercados sem perder origem de luta.Festival de Curtas começa hoje em São Paulo com filmes de 60 países.O Balé Que Você Não Vê é inspirado na luta cotidiana de uma companhia profissional para se manter viva financeiramente e tecnicamente. Para o diretor-geral e fundador da companhia, Walson Botelho, mais conhecido como Vavá Botelho, a montagem reflete a resistência da dp BFB. O espetáculo é montado com base em três coreografias desenvolvidas especialmente para a produção: Bolero, de Carlos Durval; Okan, de Nildinha Fonseca; e 2-3-8, de Slim Mello. Além delas, está incluído também o repertório clássico do grupo, com Afixirê, uma coreografia de Rosângela Silvestre.
“[O recado da companhia com o espetáculo] é que a gente existe neste país. São 37 anos de quase invisibilidade de uma companhia que é visível no mundo inteiro, extremamente conhecida, com um trabalho desenvolvido há 37 anos e reconhecido mundialmente em todas as instâncias e, no entanto, no país, a gente tem muita dificuldade em mostrar essa nossa existência de maneira geral”, contou em entrevista à Agência Brasil.
As apresentações na capital fluminense fazem parte da oitava edição do MoviRio Festival, que, durante quatro dias consecutivos, terá mostras competitivas, palestras, workshops e intervenções artísticas, com foco no intercâmbio e na troca de experiências que impulsionam a dança e sua transversalidade.
Para trazer boas energias e garantir o Axé para a temporada, na quinta-feira (21), véspera da estreia no Rio, o BFB fez uma cerimônia de lavagem das escadas e da entrada do Teatro João Caetano. Vestidos de branco, os bailarinos seguravam potes com água e flores na mesma cor, enquanto os atabaques ecoavam na Praça Tiradentes.
Temporada nacional
O diretor destacou que a temporada de O Balé Que Você Não Vê pelo país foi elaborada para festejar os 30 anos da companhia, mas, por falta de apoio financeiro, só foi para frente sete anos depois, com o patrocínio do Will Bank.
“Apoiar o Balé Folclórico da Bahia, em sua primeira grande turnê pelo país, é a nossa forma de reconhecer e mostrar para todo mundo a potência que esse grupo construiu em 37 anos de muita história e talento”, afirmou o CEO do Will Bank, Felipe Félix.
Sucesso internacional
O Balé Folclórico da Bahia, que tem sede no Pelourinho, em Salvador, já se apresentou em mais de 30 países e 300 cidades do mundo. Para Vavá Botelho, esta montagem trará mais visibilidade do grupo no Brasil, o que não ocorreu até agora.
O fundador atribui a falta de visibilidade no Brasil, em parte, ao preconceito que ainda existe em relação à cultura popular e ao folclore, que segundo ele, são vistos como formas menores da cultura brasileira.
Essa situação, no entanto, também já foi enfrentada pela companhia fora do país. Em 1994, o BFB foi convidado para se apresentar na Bienal de Dança de Lyon, na França. Botelho lembra que, de início, houve um desprezo da imprensa e do público pelo fato de o festival levar uma companhia folclórica, mas o BFB conseguiu reverter a situação.
“Foi um sucesso tão grande que a gente foi contratado, em princípio, para fazer três apresentações e fizemos sete, porque, com um ano de antecedência, os ingressos iam se esgotando”, revelou, acrescentando que, mesmo assim, os cartazes de divulgação espalhados na cidade ocultavam a palavra Folclórico do nome do Balé.
Em outro exemplo do reconhecimento no exterior, Vavá lembrou que o calendário oficial da cidade norte-americana de Atlanta comemora, sempre em 1º novembro, o Dia do Balé Folclórico da Bahia, por todo o trabalho de promoção, divulgação e valorização da cultura negra no mundo, inclusive nos Estados Unidos. Isso, segundo o diretor-geral, se contrapõe à situação do grupo no Brasil, onde enfrenta diversos obstáculos para se manter, especialmente, pela falta de patrocínios.
“A gente tem muita dificuldade, desde sempre, em circular pelo país, em mostrar nosso trabalho, montar trabalhos e em ter patrocínio. O Balé nunca teve um patrocínio de manutenção. Nós recebemos apoio, extremamente importante e vital, se não, não existiríamos, da prefeitura e do governo do estado, através das secretarias de cultura”, comentou.
Esse apoio, conforme o fundador do BFB é feito por meio de editais, que têm um limite de valor pequeno, porque são projetos divididos com inúmeras instituições no estado da Bahia e em Salvador.
“Isso colabora para que a gente possa sobreviver, viver e pagar as nossas contas, uma vez que a gente tem um elenco e uma companhia muito grande. Temos um teatro [Teatro Miguel Santana] em Salvador, onde completamos, no dia 25 de julho, 30 anos em cartaz, e onde funciona a sede do Balé. Antes pandemia, eram espetáculos diários. Depois, a gente só conseguiu voltar com três dias na semana, com lotação esgotada”, afirmou.
Dançarina do Balé Folclórico da Bahia Célia Santos/Divulgação
Fada madrinha
No meio da sua trajetória o BFB encontrou uma pessoa que contribuiria diretamente com a divulgação da companhia no exterior: a crítica de dança do jornal The New York Times Anna Kisselgoff, que fez um artigo elogioso ao trabalho.
“O prazer dos dançarinos, músicos e cantoras em fazer o que eles fazem sobre o palco, é tão obviamente parte da vida deles, que contagia todo o teatro”.
A avaliação da jornalista chamou atenção “Eu já assisti seus maravilhosos bailarinos em diferentes países, sempre se comunicando com o público. Crianças e adultos são tomados de imediato pelos ritmos e encantos de sua arte”. Conforme o BFB, em 1994, a Associação Mundial de Críticos reconheceu a companhia como a melhor de dança folclórica do mundo.
Zebrinha
A direção artística do BFB, desde 1993, está sob a responsabilidade de José Carlos Arandiba, conhecido como Zebrinha. A principal fonte de inspiração para as pesquisas do grupo é a própria Bahia e suas manifestações populares.
“O nosso grande empenho e grande projeto é a formação de artistas dançarinos em todas as áreas técnicas, e esse espetáculo é tudo aquilo que damos em sala de aula e nunca apresentamos”, disse em entrevista à Agência Brasil.
“A gente quer surpreender o mundo e mostrar que os dançarinos do Balé Folclórico da Bahia podem se inserir, podem dançar e representar qualquer estilo de dança, porque essa é a preparação que os alunos têm”, contou, acrescentando que o BFB tem dois grandes propósitos: a formação e a preservação das culturas afro-brasileira e nordestina.
“Esses são os dois grandes objetivos e, juntando esses dois objetivos, fazer com que os adolescentes e jovens que entram na nossa companhia aprendam que não são cidadãos de segunda classe e que podem se transformar em artistas de ponta. A gente tem conseguido isso na nossa trajetória”, pontuou Zebrinha.